domingo, 28 de setembro de 2008

O sentido da vida

Hoje encontrei o Jorge.
Decorria o ano de 1992, eu recem retirado da canoagem de competição, dava aulas de canoagem no clube.
Jorge Pereira, 30 e poucos anos, militar de profissão, 1ºSargento do Exército, queria aprender canoagem, fui seu professor e companheiro enquanto quis por lá andar, pessoa muito dinâmica, um dia não estava bom para remar, convidou-me para uma corridinha, aceitei até porque tava habituado.
Ao ver que o Jorge nunca mais parava, perguntei se ele estava habituado a correr, respondeu "faço umas maratonas".
Tava explicado, tambem fiquei nesse dia a saber que era "Ranger" tinha frequentado á pouco o Curso de Operações Especiais em Lamego.
A guerra do Golfo ainda tava em fase de rescaldo, 1ºSargento Pereira tinha-se oferecido para uma comissão de 6 meses, com o que ganharia na comissão queria comprar o sonho de ter uma carrinha Opel Astra.
Soube que o Jorge embarcou, nunca mais o vi, até ao dia do meu casamento em 1993, em que vejo na estrada nacional nº10 á saida de Alhandra, uma carrinha Astra parada em plena estrada a fazer sinais de luzes, era o Jorge.
Apareceu-me uns meses depois no clube, para me cumprimentar e mostrar a carrinha, mostrei o Opel Corsa 1.4 SI que a empresa me havia "oferecido".
Pouco mais soube do Jorge, até á meia duzia de anos atrás, apareceu no clube junto com a esposa, não o reconheci, aquela pessoa extremamente dinâmica, imparável e cheia de vontade de vencer, tinha tido um AVC, paralizado do lado esquerdo, mal conseguia andar, é daquelas situações que nos parte ao meio como pessoas e nos leva a pensar no sentido da vida.
A esposa contou-me á parte o que se tinha passado, o quanto estava a ser dificil para ele, e tambem para ela, muito mais sendo ele uma pessoa que não sabia o significado do "estar parado".
Hoje tive de ir á Gare do Oriente, estacionei o carro no parque e desci as escadas, passo por uma pessoa de bengala, a cambalear ligeiramente e com o braço esquerdo paralizado, "é o Jorge, pensei".
Chamei, ao que ele acedeu, era ele e reconheceu-me,cumprimentou-me segurando a bengala com o queixo contra o peito, falámos um pouco, mais sobre o que estou eu a fazer porque da parte dele limitou-se a um "agora é ir vivendo", disse-me que vai algumas vezes a Alhandra e procura-me sempre, "temos andado desencontrados", a conversa termina com um "sempre que fores a Alhandra procura-me, ando sempre pela borda d'água, assim o meu barco esteja lá".
Despedimo-mos, não mais parei de pensar no sentido desta vida.
Hoje encontrei o Jorge, um sobrevivente.

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