"Dóris", frágeis e modestas embarcações, que souberam honrar e engrandecer a profissão dos verdadeiros homens do mar.
Os pescadores bacalhoeiros que embarcavam nos Lugres, com destino aos bancos da Terra Nova e eram largados nos dóris, jornada após jornada, para pescar o bacalhau á linha.
Comprimento total 5,30 m
Largura total 1,50 m
Cada lugre partia de Portugal com dóris em numero suficiente para atribuir um a cada pescador e ainda restavam alguns suplentes. O "Creoula" trabalhava com 52 pescadores, e levava 58 dóris.
Os dóris eram empilhados no convés em lugares préviamente estabelecidos, todos os pescadores, desde o primeiro dia, tratavam com o maior respeito os "botes do bacalhau", logo desde a sua chegada a bordo.
O navio largava de Belem com destino aos bancos da Terra Nova, a viagem demorava cerca de 11 dias, passado o Cabo Raso, os dóris ficavam logo com outro aspecto.
O Mar saltava acima da borda, respingava por todo o lado, o dóris iam ficando reluzentes, brilhantes e bem molhados, e assim ficariam durante seis meses, começava a vida destes pequenos herois lutadores.
Os homens durante a viagem preparavam-se para a dura faina, o contra-mestre distribuia as botas de borracha, seis pares de luvas de lã para cada homem, fatos e chapeus de oleado, (os suestes).
Os dóris eram sorteados e distribuida a sua palamenta, eram distribuidas as varas para os mastros e o pano para as velas, assim como o óleo de linhaça para as impregnar.
Banco da Terra Nova, era iniciada a pesca, a cada pescador era distribuido 15 kg de isco, o Capitão manda arrear os botes, ao fim de meia hora todos os botes estavam no mar. Uns a remos, outros á vela, iam-se afastando do navio, cada um no bote era senhor da sua sorte e restava esperar a ordem do navio para regressar.

Durante os dias de nevoeiro, a buzina ia atroando o ar com os seus dois toques longos.
O Comandante recomendava aos mais velhos que cuidassem dos mais novos.
"Olhem que não quero esses rapazes ao abandono, não me vão para longe, nem me apareçam cá sem eles".
Ás 3 da tarde o comandante lançava o foguete, era o sinal do fim da faina diária e que indicava onde estava o navio, era hora de regressar a bordo.
A partir dessa altura a buzina era de 3 toques, os pescadores entendiam-se entre si, por toques de buzio que combinavam préviamente.
Com dias melhores e dias piores, o tempo ia passando e os rapazes já eram senhores dos seus dóris, aos poucos amadureciam ás suas custas.
Cada pescador poderia pescar 600 kg de peixe num bom dia de pesca.
Nos principios de Junho, o navio reabastecia no porto de North Sidney na Nova Escócia (Canadá).
Após o reabastecimento o navio dirigia-se para o Estreito de Davis, na costa oeste da Groenlândia, e ficavam por lá pescando até aos primeiros dias de Setembro, com o clima mais agreste que um pescador sózinho, num bote de 5 metros possa imaginar.
Na primeira semana de Setembro, o Comandante dava por terminada a pesca, era hora de regressar a casa com o navio carregado de bacalhau salgado.
Na viagem de regresso estavam todos cansados, homens e dóris, todos mostravam no seu aspecto como tinha sido essa luta durante os arduos seis meses de campanha.
Os pescadores crispados pelo tempo, barba crescida, pele queimada e mãos gretadas. Os dóris esfolados, riscados pelos anzóis e pelos garfos da descarga, não conseguiam esconder os seus males.
Cavernas partidas, tábuas estaladas e gretadas, remendos com fios de algodão e pedaços de lona, tudo para tapar as feridas do tempo.
Mas tudo era apagado pela alegria do regresso a casa, o tempo e a água do mar começavam a aquecer e os dias contavam-se ao contrário. Deixavam de se os que ainda faltam e começavam a ser os que já só faltam.
O avistar do Cabo da Roca era o melhor remédio para sarar todas as feridas, os dias frios de mau tempo e o cansaço.
O navio entrava a magnifica barra do Tejo e dirigia-se para o Barreiro, onde o peixe era descarregado.
Os dóris tambem iam deixar o navio por alguns meses, iam para a oficina de carpintaria sarar as feridas.
Essa ausência do local de trabalho, não era mais que um merecido repouso, para se recomporem e alindarem, de forma a estarem aptos para quando os pescadores voltarem a precisar deles.
Alguns velhos e cansados para uma vida tão dura, eram usados nas reparaçôes do casco e pinturas, era mais uma forma de continuar vivo e útil, junto daqueles que os estimavam e compreendiam.
Era esta a ordem natural da vida dos valentes e humildes dóris dos bancos.
Those were heroes of a kind
in "Um pequeno herói"